Na semana passada (14 a
18/01) o governo de Minas Gerais abriu as portas da primeira unidade de mais
um complexo penitenciário em Ribeirão das Neves para a imprensa. Os jornais noticiaram,
repetidamente, as inovações tecnológicas de segurança e as instalações físicas
do que consideram a maior inovação do sistema penitenciário na América Latina:
privatizar o sistema, ou seja, abrir mais um negócio para os capitalistas. No
caso, empresas (do ramo da construção civil) dos estados do Paraná e São Paulo.
Mas
o que o Governador e o Secretário de Defesa Social não disseram é que na
contabilidade capitalista não existe filantropia, não existe trabalho ou
negócio sem lucro. De onde vão tirar o lucro? Primeiro, a fonte anunciada de
investimento foi o BNDES. Segundo, elevaram o preço dos custos por preso para
R$2.700,00 mensais (preço de inauguração!). E não tem mágica, para tirar lucro.
Para tal, os salários deverão aos poucos serem corroídos e rebaixados, a
qualidade dos serviços deverá cair para a segunda ou terceira categoria, as
promessas dos serviços de assistência espaçados e rebaixados. Essa história
todos nós conhecemos. No final, quem “paga o pato” é a sociedade e, no caso,
diretamente, o preso.
Nos
EUA, onde esse negócio já existe há mais de uma década, tem rendido muito aos
capitalistas, mas a violência não diminuiu. O que aumentou foi o número de
pessoas nas cadeias. E o ser humano, que já não vale nada (“é bandido!”), tem
sua desumanidade aprofundada e levada ao extremo. E ninguém duvida da péssima
qualidade que temos nos presídios do Brasil, o que é declarado até pelas
autoridades constituídas.
Não
serão , é lógico, os capitalistas que vão melhorar essa realidade. A sociedade
contribui com impostos e definiu na Constituição Federal que é o Estado
Brasileiro o responsável pelos cuidados e a execução das penas de quem vai para
as prisões. Mas aqui em
Minas Gerais , o governo está se desresponsabilizando de suas
funções, a imprensa não divulga e os
órgãos de justiça não condenam.
O
governo estadual não disse e a imprensa não quis ouvir que a população de Neves
repudia essa inauguração e vem lutando, desde 2005, contra mais prisões na
cidade. Não porque tem preconceito contra preso, mesmo porque aqui vive boa
parte dos familiares dos detentos de todo o estado de Minas Gerais. O que a
imprensa não quis ouvir e o governo não disse, é que mais prisões implicam em
que os serviços públicos de saúde, transporte, educação e assistência social,
que já são precários, vão ficar ainda piores no município. Sem falar da
precariedade física e de pessoal nos órgãos judiciários, que vão ficar mais
lotados e morosos com mais presos e seus familiares na cidade.
A
imprensa tem memória curta, e o governo não contou para ela que suas promessas
de compensação social para a cidade nunca chegaram. Prometeu, desde 2003,
melhorar a rodovia estadual (LMG 806) que liga o centro da cidade a
Justinópolis e BH. Mas ela continua estreita, lenta e matando gente. Mas, com
certeza, já rendeu muitos votos ao governo atual. Os políticos anunciam todos
os anos que o governo estadual está mandando milhões de dinheiro para o
Hospital São Judas Tadeu, mas eles não chegam. O governo diz que mandou e o
prefeito diz que não viu. Onde está o recurso? Será que o “gato comeu”?
O governo não disse e a
imprensa não quis ouvir que não há compensação e o governo ainda aumentou sua
dívida social e ambiental para com a cidade. Ele está construindo o complexo
penitenciário de 14,5 ha , num terreno de 2000 ha da Fazenda Mato Grosso, área
declarada como de preservação ambiental (APA), destruindo matas e córregos. E
está destruindo mais uma dezena de hectares para construir uma nova estrada ligando
o presídio à BR 040. E conseguiu isso com muita manipulação dos órgãos e
conselhos de meio ambiente do estado.
O
que o governo não disse e a imprensa não quis ouvir é que está agindo de forma
inconstitucional e ilegal, ferindo a Constituição federal e a Lei estadual
12.936/98, que em seu artigo 6º limita a capacidade da unidade a um máximo de
170 (cento e setenta) presos, sendo que estão sendo construídas cinco unidades
para 3040 (três mil e quarenta) sentenciados, distribuindo em cada uma, cerca
de 600 presos. Além disso, a própria lei que regulamenta as parcerias
público-privado (PPP), Lei 11.079/04, estabelece “a indelegabilidade das
funções de regulação, jurisdicional, do exercício do poder de polícia e de
outras atividades exclusivas do Estado”, ou seja, o Estado não pode e não deve
repassar suas funções sociais para serem executadas pela iniciativa privada.
O
que o governo não disse e a imprensa não quer ouvir é que a inauguração de mais
um presídio em Ribeirão das Neves, em parceria público-privada, não tem nada de
novo e é ilegal, imoral e inconstitucional.
O
que a imprensa não quer divulgar é que a sociedade civil organizada da cidade
vem se fazendo ouvir e exercendo sua liberdade de expressão desde 2005, quando
criou a Rede Nós Amamos Neves exatamente para expressar a recusa da população
de Neves à imposição autoritária dessa penitenciária privatizada ao município,
que já acolhe mais de 10% dos 45 mil detentos de Minas Gerais. E assim a
população vai continuar: lutando e denunciando seja na rua, ou nas ações
jurídicas contra esse projeto de injustiça e morte.
CEPI
– Centro de Estudo, Pesquisa e Intervenção Ribeirão das Neves
Rede
Nós Amamos Neves
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